Conhecer uma mesquita islâmica...há alguns anos poderíamos dizer que essa seria uma visita improvável. Que bom que a vida te dá sempre uma oportunidade de quebrar preconceitos e checar as coisas com os seus próprios olhos. Bem, fizemos isso ontem. Todos da organização foram muito simpáticos e nos sentimos bem recebidos. O lugar é simples e sóbrio e o salão de orações é fechado para não-muçulmanos, mas a vista do lado de fora é bem bonita, transmitindo paz.
Um guia muito educado e com bom inglês nos mostrou que os muçulmanos não são assim tão fechados e nem avessos a pessoas de outras religiões e crenças. Ele nos explicou de forma muito esclarecedora várias coisas sobre os símbolos, horários das orações, princípios norteadores do Islã e nos convidou a folhear uma versão do Alcorão na língua portuguesa. Várias vezes nos perguntou se tínhamos dúvidas e sugeriu que ficássemos a vontade para questionar qualquer coisa.
Depois fizemos algumas fotos no vão livre enorme que tem do lado de fora (cabem 15.000 pessoas nessa mesquita). Valeu a tarde e logicamente, depois disso, Raul e eu ficamos conversando um tempão sobre tudo e a reflexão que ficou dessa visita e que gostaríamos de compartilhar com vocês é a seguinte:
Por várias vezes nessa viagem eu tenho me lembrado do "Mito da caverna de Platão", aquela passagem clássica da Filosofia contida no livro “A República”, onde Platão discute sobre a teoria do conhecimento, linguagem e educação na formação do Estado ideal.
Em resumo, o texto fala da imagem de prisioneiros que desde o nascimento são acorrentados no interior de uma caverna e somente enxergam uma parede iluminada por uma fogueira, com sombras de estátuas projetadas, únicos seres que os prisioneiros conhecem. Um dia, um destes prisioneiros é forçado a romper as amarras e checar o interior da caverna, percebendo que a visão era permitida pela fogueira e os "seres reais" eram as estátuas e não as sombras. Assim, se deu conta que passou a vida inteira julgando apenas sombras e ilusões, desconhecendo a verdadeira realidade.
Imaginemos que esse mesmo prisioneiro fosse tirado da caverna. Ao sair, a luz do sol ofuscaria sua visão e só depois de muito tempo, voltaria a enxergar e conhecer as maravilhas dos seres fora da caverna. Logo veria que aqueles seres eram muito mais reais do que as sombras e as estátuas que conhecia até então. Assim, ele poderia contemplar a verdadeira realidade, ou seja, os seres como são realmente.
Maravilhado com o mundo novo, iria se lembrar de seus antigos amigos dentro da caverna e sentiria pena deles, da escuridão em que estavam envoltos e voltaria à caverna para lhes contar sobre o novo mundo que descobriu. No entanto, como os prisioneiros não poderiam visuallizar nada senão a única realidade que sempre conheceram, debochariam do amigo liberto, o qual seria julgado como louco e isolado do grupo.
E penso sempre neste mito porque, após estes intensos 3 meses de coisas novas e experiências ímpares, me sinto exatamente assim, como o prisioneiro que saiu da caverna. A caverna pode ser vista como nossa zona de conforto e a nossa rotina previsível, sendo que na maioria das vezes acreditamos que tudo corre da melhor maneira, que estamos absolutamente certos nas convicções que recebemos da sociedade e do mundo à nossa volta, que temos costumes perfeitos, tradições louváveis, que precisamos seguir padrões que nos são impostos e acumular coisas e riquezas materiais.
Mas por outro lado, a caverna limita nosso horizonte, pois quando percebemos que o tempo passa rápido demais e que nem sempre as coisas estão sob nosso controle, que é absolutamente possível ser mais flexível, compreender as diversidades do mundo, viver com menos, ter apenas aquilo que de fato você precisa, ser menos cruel com todo mundo e com as cobranças internas, aceitar as diferenças das pessoas, você se maravilha. E nossa constatação, talvez até nosso receio ao final dessa viagem é de que, uma vez saindo da caverna, fica difícil voltar para dentro dela...
É isso. Minha intenção com este post de hoje é de simplesmente dividir nossas reflexões com vocês e divagar sobre nossas cavernas internas. Forte abraço a todos e obrigado por acompanhar nosso blog!!!